quarta-feira, 9 de abril de 2014

Uma enorme área do Pacífico está tomada por cerca de 100 milhões de toneladas de lixo

O maior depósito de lixo do mundo não se localiza em terra firme. Está no Oceano Pacífico, numa imensa região do mar que começa a cerca de 950 quilômetros da costa californiana e chega ao litoral havaiano. Seu tamanho já se aproxima de 680 mil quilômetros quadrados, o equivalente aos territórios de Minas Gerais, Rio de Janeiro e Espírito Santo somados – e não pára de crescer.

Descobridor do aterro marinho gigante, também chamado de “vórtice de lixo”, o oceanógrafo norte-americano Charles Moore acredita que estejam reunidos naquelas águas cerca de 100 milhões de toneladas de detritos – que vão desde blocos de brinquedos Lego até bolas de futebol e caiaques. Correntes marinhas impedem que eles se dispersem. “A idéia original que as pessoas tiveram foi que era uma ilha de lixo plástico sobre a qual você quase poderia andar”, observa Marcus Eriksen, diretor de pesquisas da Algalita Marine Research Foundation, organização norte-americana criada por Moore. “Não é nada disso. É quase uma sopa plástica.”

Cerca de 20% dos componentes desses depósitos são atirados ao mar por navios ou plataformas petrolíferas. O restante vem mesmo da terra firme. Segundo o oceanógrafo Curtis Ebbesmeyer, especializado em destroços de navegação e que acompanha a presença de plásticos nos mares por mais de 15 anos, o vórtice de lixo se assemelha a um organismo vivo: “Ele se move como um animal grande sem coleira.” A aproximação dessa massa à terra firme, por eventuais mudanças de correntes marinhas, produz efeitos temíveis, assinala o cientista: “A colcha de lixo regurgita, e você tem uma praia coberta com esse confete de plástico.”

MOORE DESCOBRIU o mar de lixo por acaso. Em 1997, ele participava de uma competição de iatismo entre Los Angeles e o Havaí e tentou cortar caminho por uma rota evitada pelos navegadores, entrando no vórtice conhecido como North Pacific Gyre (“Giro do Pacífico Norte”) – uma região sem ilhas onde as águas do Pacífico se movimentam lentamente de forma circular, no sentido horário, por conta de ventos escassos e fortes sistemas de alta pressão. O acúmulo de detritos ali chega a tal ponto que para cada quilo de plâncton nativo da região contamse seis quilos de plástico.

Moore ficou boquiaberto por se ver cercado de detritos, dia após dia, a tamanha distância do continente. “A cada vez que eu subia ao convés, havia lixo flutuando perto”, ele disse numa entrevista. “Como pudemos emporcalhar uma área tão imensa? Como isso podia continuar por uma semana?” A experiência marcou tanto o oceanógrafo que ele, herdeiro de uma família que fez fortuna com petróleo, vendeu toda a sua participação acionária e se tornou um ambientalista.

Ouvido pelo jornal inglês The Independent, o oceanógrafo David Karl, da Universidade do Havaí, considera que é preciso fazer mais pesquisas para determinar o tamanho e a natureza da sopa plástica. Mas não duvida da descoberta de Moore. “Afinal, o lixo plástico está indo para algum lugar, e já é hora de termos um relatório completo da distribuição de plástico no ecossistema marinho e, especialmente, seu destino e impacto nos ecossistemas marinhos.”

Karl está coordenando com a fundação de Moore uma expedição ao mar de lixo no segundo semestre deste ano, e acredita que a expansão da área do vórtice já representa um novo habitat marinho.

Sabia-se que os detritos que acabavam nas regiões de giros se decompunham na natureza, mesmo com a proteção aos raios ultravioleta oferecida pela água do mar. A durabilidade dos plásticos modernos, porém, mudou bastante esse perfil – eles podem levar centenas de anos para se degradar. No lixão do Pacífico Norte já foram encontrados plásticos fabricados há 50 anos. Segundo Moore, como o mar de lixo é translúcido e situa-se abaixo da superfície oceânica, não é detectável nas fotografias de satélites. “Você o vê apenas da proa dos barcos”, afirma. Como ainda nada se faz sobre o problema, ele só tende a crescer. No início de fevereiro, Moore alertou que, se os consumidores não reduzirem o uso de plástico descartável, a “sopa” do Pacífico Norte poderá dobrar de tamanho na próxima década.

Acredita-se que 90% do lixo flutuante nos oceanos é composto de plástico – um índice compreensível, já que esse material é um dos que levam mais tempo para se decompor na natureza. No Mar Mediterrâneo, considerado o mais poluído do planeta, cada quilômetro quadrado contém cerca de duas mil peças de plástico flutuante. Esses detritos têm efeito trágico sobre a vida animal. De acordo com o Programa Ambiental da ONU, os entulhos plásticos são responsáveis anualmente pela morte de mais de um milhão de pássaros e de cem mil mamíferos marinhos, como baleias, focas, leões-marinhos e tartarugas. As aves marinhas confundem objetos como escovas de dente, isqueiros e seringas com alimento, e diversos deles foram encontrados nos corpos de animais mortos.

SEGUNDO CIENTISTAS holandeses, de um grupo de cem fulmares (aves marinhas das regiões árticas), mais de 90 morrem com resíduos de plástico em seus estômagos. Os pesquisadores estudaram 560 fulmares provenientes de oito países e descobriram que os pássaros haviam ingerido em média 44 itens de plástico. Apenas um desses animais, recolhido morto na Bélgica, tinha em seu corpo 1.603 diferentes pedaços de plástico. Uma tartaruga encontrada numa praia havaiana apresentava em seu estômago e intestinos mais de 1.000 pedaços de plástico.



Marcus Eriksen ressalta que a água com essa massa de lixo marinho também representa um risco para a saúde humana. Centenas de milhões de minúsculas bolinhas de plástico, a matéria- prima dessa indústria, são perdidos ou desperdiçados anualmente e acabam por chegar ao mar. Esses poluentes atuam como esponjas, atraindo substâncias químicas produzidas pelo homem, como hidrocarbonetos ou o pesticida DDT. O passo seguinte é eles entrarem na cadeia alimentar. A esse respeito, Eriksen salienta: “O que vai para os oceanos vai para esses animais e vem para seu prato” – um lembrete, como se vê, mais do que oportuno.

Fonte: Jornal Meio Ambiente | Terra

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